14 de março 2024
16h30-18h00 | Sala do Departamento de Filosofia
18h00-19h30 | Sala 111
(Aesthetics, Politics and Knowledge Research Group (APK) - Instituto de Filosofia da Universidade do Porto)
Uma nuvem esplêndida numa bela tarde ensolarada não tem mais realidade ontológica do que uma névoa rosada levada pelo vento. Ambas insistem no seu ser para impor o seu modo de existência. Toda a existência é tão perfeita quanto pode ser, não existindo hierarquia entre todas as coisas que existem. Assim, não podemos dizer que uma existência é mais real que outra, nem seria apropriado tomar um tipo de existência como padrão e, a partir daí, julgar todas as existências que deste padrão se afastam ou se aproximam, conferindo-lhes o seu grau de realidade. Fernand Deligny – a partir da sua trajetória entre vários estabelecimentos educacionais, médicos ou jurídicos franceses, voltados para a infância e para a adolescência – defendeu o valor de cada existência e a forma singular pela qual certos indivíduos habitam o mundo. Deligny não pretendia partir de um modelo com a intenção de adaptar, conformar ou normalizar os comportamentos. Diferentemente, ele estabelecia as suas próprias formas de se relacionar com a singularidade dos indivíduos com os quais conviveu, valorizando as existências consideradas inadaptadas pelos parâmetros de normalidade a que eram submetidas.
Ao longo das suas experiências, Deligny utilizou três dispositivos que procuravam considerar o inapreensível que cercava o agir desses indivíduos no seu relacionamento quotidiano com as coisas no espaço: a escrita, a câmara e os mapas. Com base no rasto dessas experiências, veremos como considerou os modos de existência de seres cuja realidade é obscurecida por tentativas de delimitar a sua diferença qualificando-a como deficiência. O nosso objetivo é, então, reivindicar a criação de territórios onde seja possível libertar existências singulares, construindo novas escutas e novas linguagens, permitindo o surgimento de modos de vida que escapam às formas hegemónicas de existir.
* Carlos Machado é investigador do Instituto de Filosofia da Universidade do Porto, no Grupo de investigação Aesthetics, Politics and Knowledge.
Imagem: Fotograma do filme Ce gamin-là, dirigido por Renaud Victor, França, 1975.
Organização:
Eugénia Vilela
Research Group Aesthetics, Politics and Knowledge
Instituto de Filosofia da Universidade do Porto - UIDB/00502/2020
Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT)